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sábado, 18 de outubro de 2008

Redenção

Esse não é nosso maior parque tampouco o mais bem cuidado, mas é o que abriga, na minha concepção, o espírito de Porto Alegre. Eu nem mesmo andava e já era freqüentadora. Tenho muitas fotos lá, quando ainda passeava no carrinho com minha boneca de tricô. É um lugar lindo, mágico e encantador. Um espaço cheio de natureza quase no centro da cidade. Um espaço onde, se soubermos por onde andar, não escutamos o barulho dos carros e ônibus que circulam em abundância na região.
Mas não devemos fazer isso. Andar sozinho no meio das árvores é um risco muito grande, sei disso desde sempre, contudo, nem sempre resisto. Ando sempre em alerta, com cuidado, pois o medo já é nosso companheiro de todas as horas e lugares, nossa metrópole esta quase tão violenta quanto as outras.
Numa terça de manhã, ao sair da aula, me encantei olhando a chuva cair com força no lago do chafariz ao lado do viaduto. A cena era deslumbrante. De repente percebi dois homens se aproximando. Fiquei desconfiada, mas como estavam uniformizados, com roupas semelhantes às usadas pelos funcionários do parque, não dei muita atenção. Logo eles se aproximaram e roubaram minha bolsa. Em plena manhã.
A Brigada disse que é assim mesmo, que os assaltantes usam os dias de chuva para ampliar seus roubos já que poucas pessoas vão à rua. A civil registrou a ocorrência com uma naturalidade completa, afinal isso são coisas que acontecem várias vezes por dia. O descaso foi absoluto. Não acharam nem mesmo minhas carteirinhas inúteis, de clube, universidade, convênio médico, etc.
Sempre fui completamente contra a violência, o uso de câmera em larga escala, o cercamento dos parques e o armamento da população. Contudo esse episódio me fez pensar mais seriamente. Tinha sido roubada outra vez, no Rio, entretanto era diferente, em dois dias estaria em casa outra vez onde tudo era seguro. Sempre me senti tranqüila e confortável, na minha cidade, ainda mais no meu parque. Hoje é diferente.
Se ainda queremos levar nossos amigos e familiares para tomar um chimarrão naqueles imensos gramados, devemos investir na segurança. Eu não quero deixar de aproveitar as maravilhas desse éden em meio à cidade, fumaça, concreto e ruído.
Quero ensinar meus filhos a jogar bola, conversar com as amigas num piquenique no final de semana ou simplesmente usar o silêncio para ler um bom livro. Por isso, penso que devemos pensar em algo. O cercamento é uma idéia que vejo com bons olhos. A vigilância através do uso de câmeras é interessante. Poderíamos usar os dois métodos em conjunto pondo câmeras somente nas entradas. Seriam medidas que manteriam o espaço nas mãos da população e não tornariam nossa mini-floresta em território exclusivo da marginalidade como está acontecendo. Temos que, desde já, coibir o uso da arborização como esconderijo para seres mal intencionados, em toda cidade.
A guarda municipal deve ser imediatamente ampliada e sua atuação nos parques deve ser o principal foco. A Brigada que dê conta do resto. Se não houver algumas medidas para contenção da violência a curto e a longo prazo, em breve, teremos de andar armados e conviver com a possibilidade de morrer em qualquer esquina. Nunca mais saberemos se vamos voltar. Sairemos para trabalhar, estudar, comprar e passear ou só para caçar? Ou não sairemos, faremos faculdade à distância, trabalharemos via Internet, compraremos também pela rede afinal deixaremos os parques e praças da cidade abandonados, ou melhor, sendo usados como albergues para abrigar a nossa incompetência como capital da solidariedade.

sexta-feira, 17 de outubro de 2008

A propósito de um protesto

Prezados responsáveis,
Viemos por meio desta relatar o fato, pois vemos o caso como de máxima gravidade. Conforme a constituição brasileira,
Nós, representantes do povo brasileiro, reunidos em Assembléia Nacional Constituinte para instituir um Estado Democrático, destinado a assegurar o exercício dos direitos sociais e individuais, a liberdade, a segurança, o bem-estar, o desenvolvimento, a igualdade e a justiça como valores supremos de uma sociedade fraterna, pluralista e sem preconceitos, fundada na harmonia social e comprometida, na ordem interna e internacional, com a solução pacífica das controvérsias, promulgamos, sob a proteção de Deus, a seguinte CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA FEDERATIVA DO BRASIL. (...)
Art. 3º Constituem objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil:
I - construir uma sociedade livre, justa e solidária;
II - garantir o desenvolvimento nacional;
III - erradicar a pobreza e a marginalização e reduzir as desigualdades sociais e regionais;
IV - promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação. (...)
Art. 4º A República Federativa do Brasil rege-se nas suas relações internacionais pelos seguintes princípios: (...)
VI - defesa da paz;
VII - solução pacífica dos conflitos;
VIII - repúdio ao terrorismo e ao racismo;
IX - cooperação entre os povos para o progresso da humanidade;
Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes: (...)
IV - é livre a manifestação do pensamento, sendo vedado o anonimato;
V - é assegurado o direito de resposta, proporcional ao agravo, além da indenização por dano material, moral ou à imagem;
VI - é inviolável a liberdade de consciência e de crença, sendo assegurado o livre exercício dos cultos religiosos e garantida, na forma da lei, a proteção aos locais de culto e a suas liturgias;
VII - é assegurada, nos termos da lei, a prestação de assistência religiosa nas entidades civis e militares de internação coletiva;
VIII - ninguém será privado de direitos por motivo de crença religiosa ou de convicção filosófica ou política, salvo se as invocar para eximir-se de obrigação legal a todos imposta e recusar-se a cumprir prestação alternativa, fixada em lei;
IX - é livre a expressão da atividade intelectual, artística, científica e de comunicação, independentemente de censura ou licença;
X - são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurado o direito a indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação;(...)
Art. 19. É vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios:
I - estabelecer cultos religiosos ou igrejas, subvencioná-los, embaraçar-lhes o funcionamento ou manter com eles ou seus representantes relações de dependência ou aliança, ressalvada, na forma da lei, a colaboração de interesse público;
Por tudo que a nossa constituição significa em termos de organização social, me parece inadmissível que um professor de uma Universidade Federal, laica e que está buscando a inclusão social aja contra esses princípios.
O lastimável evento que fere nossos mais importantes princípios sociais ocorreu na última sexta-feira, 17 de outubro de 2008, na disciplina de Higiene, ministrada ao curso de Educação Física onde o professor veiculou um filme agressivo, preconceituoso e de extremo mau gosto que nos lembrou dos grandes totalitarismos que a humanidade viveu recentemente e aos quais nossa lei máxima reage tão claramente. Portanto, repudiamos veementemente sua atitude e, tendo em vista nossa Carta Magna, vemos em sua conduta um ato criminoso e digno de processo civil.
O filme desrespeita abertamente a crença de, segundo o último do censo do IBGE, 151165073 pessoas, ou seja, a maioria absoluta dos brasileiros. Nós, alunos dessa disciplina não queremos de maneira alguma limitar o direito do professor de ter opinião e de emiti-la livremente, contudo exigimos respeito ao nosso direito à crença, e dos seus inúmeros “financiadores”, mesmo que divergente da dele. Estudando uma universidade laica, financiada pela nossa contribuição fiscal, não queremos ser tratados de forma vexatória. Além disso, queremos alocar nossos recursos escassos, que são nosso tempo e os recursos da universidade de maneira mais adequada, ou seja, com assuntos pertinentes à disciplina de Higiene e ao curso de Educação Física.
Tendo o professor agido dessa forma no exercício do cargo e, por conseguinte, em nome da Universidade Federal do Rio Grande do Sul, exigimos, então, das autoridades administrativas competentes as medidas cabíveis ao caso.
Desde já gratos pela compreensão.
Alunos pró-respeito a toda manifestação cultural e religiosa da UFRGS.

segunda-feira, 13 de outubro de 2008

A última e talvez melhor citação

Mas talvez ainda fosse muito nova, ainda não tinha aprendido a dizer não só porque não. Que dizer não é sempre muito mais importante do que dizer sim. (p.202)

Mais uma de Sem nome (realmente vale a pena ler, mesmo que o autor não recomende)

Se a memória que os outros têm de nós é a alma que sobrevive aos nossos corpos, e creio que não há outra, então você tornou-se para mim na alma de Marta. Não por escolha sua. Por culpa minha, que a vi em si.

Sem nome de Macedo

Genocídios. Crianças africanas famintas com caras de extraterrestres. Inoperativo auxílio financeiro aos países sub-desenvolvidos. As cleptocracias. Mais de 60% do dinheiro a ir para contas suiças dos presidentes e ministros desses países. Não há como um país pobre para nele se acumularem fortunas individuais. Angola é nossa! Nossa de quem? Dos angolanos é que não é. se um desses países melhorasse a sua situação econômica e os auxílios deixassem de ser necessários, secava a mama financeira internacional. Portanto não convém aos cleptocratas locais que os seus países se desenvolvam. E tb não convém nada aos G7, ou 8, ou lá quantos são a reunirem-se em ilhas fortificadas para evitar protestos juvenis, criar futuros competidores nesses países. Todos de acordo, portanto. Menos os jovens dos protestos, mas isso passa-lhes com a idade. (p.152-3)

sábado, 11 de outubro de 2008

Educação


Além da já gritante falência da educação pública, estamos assistindo a (com e sem crase) falência do ensino privado. No caso das escolas privadas há duas formas de falência: a do ensino e a literal. Tudo isso é só um reflexo da nossa sociedade, que nunca prioriza a educação. Com a crise atingindo as famílias de classe média a primeira coisa, considerada "um luxo desnecessário", a ser cortada é a educação em escolas particulares, que até então vinham mantendo o único tipo de educação com qualidade, com exceção das escolas militares. Com a crise em seu calcanhares os colégios estão perdendo mais e mais sua qualidade. Professores mal pagos e, portanto, mal formados inundam as salas de aula. Sem ganhar horas de preparo, correção de provas e trabalhos é feita em sala de aula enquanto alunos sem atividades ficam presos na sala. Professores estressados imploram para ministrar menos horas e as escolas pressionam para que eles peguem cada vez mais mesmo que afirmem que não tem condições. Assim logo o ensino privado estará igual ou pior que o público e isso só revela as prioridades de nossa sociedade que não está disposta a pagar uma educação de qualidade.

segunda-feira, 29 de setembro de 2008

Sem nome (Macedo)

Que uma mulher diga que é mais nova do que é, tudo bem, tudo normal. Muitas vezes nem estaria a mentir mas simplesmente a ajustar a verdade à verossimilhança.

Frases

Se tivesse a tolice de se perguntar "quem sou eu?" cairia estatelada e em cheio no chão. É que "quem sou eu?" provoca um necessidade. E como satisfazer a necessidade? Quem se indaga é incompleto.
Clarice Lispector - A hora da Estrela***Um momento! Não tenho medo do ridículo. Só os imbecis têm medo do ridículo. Já reparou q toda grande dor é ridícula?
(Nelson Rodrigues)
A mente odeia o vácuo. Qnd o futuro é incerto, mas nos interessa de perto, do q ñ somos capazes p aliviar a sensação de vazio- a fome angustiante e devoradora- da incerteza? Giannetti
Gostar é provavelmente a melhor maneira de ter, ter deve ser a pior maneira de gostar. (Conto da Ilha Desconhecida- Saramago)
Em minha discreta opinião, senhor doutor, tudo quanto não for vida, é literatura. (Saramago)
É necessário sair da Ilha para ver a ilha, que não nos vemos se não saímos de nós, Se não saímos de nós próprios, queres tu dizer, Não é a mesma coisa. (Conto da Ilha Desconhecida- Saramago)
Tudo aquilo que aconteceu passou a ser validado apenas em função do que veio a acontecer e só assim podia ter acontecido pela razão evidente de assim ter acontecido. (Helder Macedo)

quarta-feira, 24 de setembro de 2008

Ensaio sobre a cegueira


Palavras me sensibilizam mais e as imagens são mais chocantes para mim. Ao ver o filme "Ensaio sobre a cegueira" fiquei chocada com as imagens, principalmente com as condições precárias de vida no sanatório. Continuo achando o livro melhor. Comentário totalmente clichê. Mas é verdade! O livro mostra muito o mundo fora do sanatório após a saída dos cegos- o caos completo. E é narrado, as palavras fazem da moça de óculos uma mulher sublime, a imagem a coloca ao lado dos mortais, embora a atriz seja bonita e atue muito bem. A mulher do médico foi maravilhosamente interpretada assim como o próprio oftalmologista a relação entre os dois foi perfeitamente recomposta. O filme é muito bom. Resalvas à parte, realmente vale a pena assitir e ler.

sexta-feira, 19 de setembro de 2008

A propósito de um comprimido


Estava no ônibus e vi um jovem rapaz com um compartimento da mochila cheio de analgésicos. Não é só ele. Lembrei que minha bolsa também possui um grande espaço dedicado a comprimidos em geral. Na verdade, todos usam: um, dois ou três por dia. Todo o dia. São analgésicos, antibióticos, antidepressivos, enfim toda sorte de “antis”. Na pós-modernidade, ninguém vivem sem eles. E eles puxam sua fila, explico: o antialérgico puxa o antibiótico que puxa o antiácido... Além do indispensável analgésico, cada vez usamos mais, mais fortes e temos mais dor. Não adianta, a dor do pós-tudo é implacável!

A propósito de uma aula

A universidade pública, gratuita e de qualidade sempre foi um dos meus lemas. Talvez por que todos na minha família se formaram em universidades federais e mesmo antes de ingressar na UFRGS já ouvia a Wrana repetir em todas as formaturas esse jargão. Fiz meu curso no tempo mínimo, sem desperdiçar recursos públicos.
Me formei e voltei a prestar vestibular, mas no mesmo ano fui aprovada no programa de pós-graduação em Literatura Brasileira. Minha nova graduação perdeu importância e confesso que não me dediquei nada, me matriculei e nunca apareci nas aulas ou fui até a primeira prova quando minha falta de dedicação gerou notas desastrosas. Temi que ao fazer uma cópia de meu histórico escolar, até então bem razoável, aparecessem esses fiascos; consegui fazer esse extrato só com o primeiro curso, contudo minha consciência não me perdoa.
Muitas pessoas quase sem patrimônio estão investindo seus escassos recursos numa formação que não tem sentido. Além disso, não me perdôo por ter deixado alguém, que provavelmente estudou bastante, de fora naquele ano em que ingressei no curso. Por isso, continuo, conforme tenho disponibilidade de tempo me matriculo novamente e estudo, só em respeito àquela criatura que ficou de fora.
Entre idas e vindas me matriculei em uma disciplina eletiva, que me pareceu interessante. Contudo, meus colegas gritam durante a aula, jogam truco e saem depois da chamada (graças a Deus deixam um pouco de silêncio em seu lugar). A professora não fica atrás, parece bem intencionada, mas chega sempre atrasada (em caráter permanente e combinado), se atrasa além do combinado, termina a aula mais cedo (dá quase 1 horas de aula quando deveria dar dois créditos!!) e dá uma aula sofrível (além de não dominar nenhum dos recursos tecnológicos a disposição para educação à distância).
Às vezes não compareço (o custo de oportunidade é alto e a categoria da aula não paga nem o deslocamento), todavia me remôo de culpa. Com todo esse desperdício e total falta de qualidade e controle, fico com medo de que grande parte dos recursos investidos nas nossas formações acadêmicas estejam indo para o lixo. Continuo achando que devemos ter ensino superior público, contudo deveríamos cobrar uma taxa por desperdício de disciplinas e nosso controle de qualidade deveria ser mais criterioso.

quarta-feira, 17 de setembro de 2008

Gentileza gera gentileza


Se ao andar pela cidade alguma vez encontrares essa placa "Gentileza gera gentileza", corre. São esses os piores lugares em termos de atendimento. Pela experiência empírica posso comprovar essa tese, mas também podemos pensar por que isso acontece: gentileza deve ser espontânea, não é um bem "trocável". Alguém que muito me ensinou disse: "Sorri uma vez, podem não te responder. Se isso acontecer, sorri outra vez. Caso isso se repita, sorri novamente, ninguém resiste a um sorriso três vezes repetido. Por isso, gentileza gera gentileza, mas quem ostenta essa placa espera que o primeiro, talvez o segundo e até mesmo o terceiro passo venha de você. Aproveite que já andou tanto e corra!!!!

terça-feira, 9 de setembro de 2008

A propósito do nosso edifício


Hoje estou nostálgica. Lembrei também dos velhos hábitos do condomínio. Fazíamos festa junina com fogueira, nos reuníamos para ver os jogos da seleção, tomávamos banho de sol na garagem e até pendurávamos roupa no salão de festas. Tudo isso bem no meio de Porto Alegre. Alguns interioranos acham que ninguém se fala nos prédios da Capital. Não foi sempre assim. Não é assim aqui. Temos um bairro de cidade do interior bem no cruzamento da Bento com a 3ª perimetral. Já não é a mesma coisa, não temos mais todos esses hábitos, muitas vezes tachados de dignos de um cortiço. Todavia ainda temos nossos jantares de encontro entre o vizinhos e nossa ecumênica festa de natal numa paz completa entre as religiões. E mais importante do que tudo, sabemos que podemos bater a porta ao lado, ou a de cima, ou a da frente (...) sempre que ocorrer um imprevisto. Seja dos pequenos: uma xícara de açucar, uma cópia à meia-noite para entregar com um trabalho amanhã (...) ou dos grandes: uma grande comoção por morte ou doença quando só se pode esperar um ombro amigo. Gostaria que nossa cidade tivesse mais recantos como esse.

Gentileza no ônibus


Tudo depende do ponto de vista. Depois de descoberta a lei da relatividade

a frase virou lugar-comum, mas não é tão óbvio assim. Nós, pessoas civilizadas, cientes dos nossos deveres sociais, nunca negaríamos o nosso acento no ônibus a uma senhora de idade ou a uma jovem com seu bebê. Entretanto o fato é raro, parece um hábito antigo do qual ninguém lembra mais. Tá certo que sou um pouco do século passado e me emociono quando vejo uma cena de simples respeito, todavia isso poderia ser mais comum. Não é. As boas maneiras estão tão fora de moda quanto os chapéus.

sábado, 9 de agosto de 2008

A propósito de um corpo

Ao chegar na esquina de casa me deparei com uma cena inusitada: um aparato policial cercava um senhor deitado no chão. A princípio, acreditei que fosse um novo atropelamento, coisa que não raro acontece nesse problemático cruzamento cheio de atropelamentos e acidentes. Contudo o homem estava deitado sob a guarda da parada de ônibus, pensei então que fosse mais um dos muitos mendigos que se abrigam sob esse parco teto; não era. Sendo assim deveria ser vítima de um dos tiroteios que eventualmente ocorrem, embora sejam comuns à noite e não a essa hora do dia quando o movimento na rua é imenso; também não era. Era um homem comum que estava esperando o ônibus quando o coração decidiu parar. Parou e ele morreu ali mesmo sem tempo de ser levado às pressas ao hospital. Morreu. E chamaram a polícia!? Vão abrir um inquérito para tentar condenar o coração que assassinou o corpo que o abrigava!? Para que toda parafernália da Brigada? Duas viaturas e nenhuma ambulância... Nem mesmo um médico! Isolaram a parada e desviaram o trânsito, mas ninguém lembrou de acender uma vela para iluminar aquela alma. Esses são os tempos modernos...

sexta-feira, 8 de agosto de 2008

A propósito de uma saudade (dessas que os interioranos radicados na capital sentem)

Sentir saudade tua não é só sentir saudade de ti,
Embora também seja
Sentir saudade de ti é a nostalgia de um tempo
E a tua presença também desperta tua saudade
De repente me vejo buscando velhas músicas
Me deixo por elas levar a viagem do tempo possível,
Por fim vejo que tua presença é própria saudade.

A propósito de um recital de piano

Ontem, um evento me surpreendeu. Fui a um recital de piano que prometia ser uma mostra de pequenos alunos temerosos mostrando seus primeiros movimentos ao piano. A primeira apresentação já mostrou que não seria exatamente o que imaginei. Uma senhora de aproximadamente 35 anos, entre meninas de plumas cor-de-rosa, mostrou com sua coragem que o velho clichê que nunca aprendemos deve ser posto em prática mais vezes: nunca é tarde para aprender.
A seguir, um garotinho de 5 ou 6 anos usando apenas seus minúsculos indicadores foi capaz de reproduzir aquelas canções infinitamente repetidas em nossa infância, mas que nunca fomos capazes de produzir em instrumento algum. As menininhas de cor-de-rosa mostraram que têm talento e estão se esforçando no aprendizado, apesar dos equívocos causados mais pelo nervosismo do que falta de prática.
Por fim, um menino, que prometia já ao olharmos o programa: uma de suas canções era de sua autoria. Evidentemente imaginei que seriam alguns simples acordes consecutivos algo esperado para uma criança de 16 anos. Errei: enquanto todos se apresentaram silenciosamente ele começou a cantar “Let it be” dos Beatles- essa música sempre me emociona- é fantástica. Mas sua composição foi ainda mais impressionante, “Música da vida” é uma melodia encantadora, por alguns momentos relembrei minha vida, pensei nos momentos passados e sofridos dos últimos dias, foi catártico: sai mais leve. Minha timidez me impediu de cumprimentar o jovem, afinal o que ele pensaria: essa senhora quer o que me dizendo isso, não entende nada de música e não sabe fazer um acorde qualquer: seria um elogio pequeno demais para sua grandeza.