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domingo, 16 de dezembro de 2012

A propósito das ausências

O final de semana foi de festas, mas, infelizmente, também de ausências. A maior e a mais gritante, chorante e difícil de engolir foi a da Dinha, como a Camila explicou bem em http://1kgdeblog.wordpress.com/2012/08/18/das-relacoes-ou-do-tamanho-das-pessoas/ , ela não era unânime, aliás, nenhuma pessoa com personalidade é, e teve muitos tamanhos para muitas pessoas e para mim mesma. Mas ela é, para tantos, uma ausência gigante, uma cratera onde o grande cânion fica pequeno, o imenso buraco negro que vi ontem nos olhos da minha vó. Uma saudade muda... surda, cega e louca - que ainda não entendeu que acabou, como acabou e muito menos porquê. Já expliquei que sou fadada a alegria em http://apropositodeportoalegre.blogspot.com.br/2011/10/fadada-alegria.html , então sofri um monte de coisas estranhas, mas estive extremamente feliz nesse findi. Fico feliz pois as ausências são pessoas marcantes que mesmo ausentes conseguem estar presentes em nós: no que eles construíram e legado que deixaram. Fico feliz por ter tido a oportunidade de ter vividos com eles.

Esses dias estava conversando com a Rafa sobre a minha sorte. Disse a ela que às vezes eu ficava com pena dela e do Josué porque eu tinha podido viver mais tempo com a vó veia, com o pai e com a Dinha. Presenças que determinaram a minha vida e definiram o que sou hoje e também o que eles são. Maldade minha dizer isso a ela e mais triste vê-la concordar; mas, como vocês já sabem, não poupo meus irmãos das reflexões mais duras. Quero que pensem e aproveitem pois ele tem a chance de viver os maravilhosos mãe, vô e vó, Tata e Bolsa e tia Zi que outros não terão - então que aproveitem.

E por isso fiquei muito feliz: pelas grandes presenças que temos em nossas vidas. Pelos amigos que herdamos deles, como disse a respeito do meu casamento em: http://apropositodeportoalegre.blogspot.com.br/2011/04/proposito-da-perfeicao.html

Pelo tio Giba, que adotou o pai como irmão na irmandade de terem famílias que queriam distante, que fez de tudo que um pai faria por um filha no dia de seu casamento pela Rafa e por mim e pela tia Ju que é a tia Ju, umas das pessoas mais complexas que já consegui entender e que virou chave para eu entender muitas outras.

Pelo Bolson, que é o tio Bolsa, mas primeiro é o grande amigo que o pai nos deixou cuidando de perto e para sempre. De quem não consigo falar muito porque nada explica o amor que ele demostra sem falar uma única palavra. A Tata, que é a nossa mãe complementar, pois é o avesso e o intercomplementar da nossa mãe, que é muito defeituosa e por isso ainda mais perfeita e única e incompreensível e que, sem nenhuma modéstia (dela e minha, se alguém perguntar pela ambiguidade), criou os filhos da forma mais perfeita que é possível e se eles têm defeitos é por que é inevitável. A Tata, assim como a minha mãe, é muito criticada por todos nós, por que somos assim na nossa forma de amar: não nos elogiamos, nos criticamos - para que os elogios venham dos outros. Por isso, mesmo que eu viva falando mal das técnicas adiministrativas dela, que contaminaram a minha vida, é por que isso é muito de mim por causa dela. (Tentei reescrever essa confusão linguística, mas não dá: ninguém vai entender a confusão sentimentalista que mistura os Michels - Bolson de um jeito que não existe definição nem fronteira entre um núcleo familiar e outro) (Assim como ninguém entende a relação MM's que transformou a vizinhança em continuidade doméstica e familiar estranha a qualquer estranho)

Pelo Élio, que em sua serenidade e distância sempre esteve ao nosso lado, criando em nós uma relação estranha com a vida como a do Josué na cadeira do dentista: que dorme e sonha, mesmo diante de um dos maiores medos da era moderna.

Pelo Dalvan e Deise que, pela primeira vez, num momento definitivo não estavam lá. Entendemos a suas ausências, mas a suas presenças em nossas vida ainda são muito maiores que esse momento. E que também são parte de nossa família mesmo sem que oficialmente sejam. E que são a presença da ausência do pai e Dinha ao mesmo tempo. (Juro que vou fazer um post sobre a força centrípeta da família Senna da Silva).

Por isso tudo estou muito feliz.

Mania de irmã mais velha II

Quando reli meu post, mania de irmã mais velha, percebi que faço isso não só com meus irmãos; mas, o que é ainda mais grave e pior, vou adotando irmãos mais novos pela vida (mesmo que eles sejam mais velhos). Sei que já escrevi que irmãos são irmãos e nada mais é irmão como um irmão; mas muitas relações de nossas vidas são de irmandade (Naquele post http://apropositodeportoalegre.blogspot.com.br/2012/07/amigos-e-irmaos.html não falei dos irmãos e irmãs mais velhos que não tive e adotei, tipo o Mano (que chamo assim para sempre), a Tuca, a Nine e a Jacque - também não falei da irmã mais nova que adotei com relutância quando ainda não tinha os meus, minha primica de tantas histórias... tantas que fiz um post só para ela http://apropositodeportoalegre.blogspot.com.br/2008/08/propsito-de-uma-saudade-dessas-que-os.html ). Mas, depois da família, veio a vida.

Na faculdade, a Candida era minha irmã mais nova que dava choque de realidade. A primeira pessoa que me disse que a Rafa e o Jô não eram crianças - nunca mais vou esquecer aquele dia no Agronomia lotado. Que me ensinou o Carpe Diem e mostrou um jeito light só os irmãos mais novos podem ver a vida. Depois a Ju, que tinha crises de perfeccionismo e eu a atropelava: me dá aqui! Chega, isso tá bom e eu vou entregar assim mesmo! (Ao que ela respondia com muitos protestos que não me demoviam de torturá-la entregando trabalhos que ela ainda queria terminar). Por fim, já no mestrado, a Sandrinha, que foi a pessoa mais guerreira que eu já conheci de perto, mas ainda assim eu a achava frágil e queria proteger a todo pano de qualquer crítica do mundo.

Na Caixa, o Márcio (o nome também ajudou a fazê-lo irmão, pois tem nome do mano) foi irmão mais novo alguns meses e nos "criamos bancários" mais ou menos juntos. O primeiro efetivamente mais novo foi o Rafa. Mas esse era fatídico, além de se chamar Rafa (e Rosa) tem o mesmo jeito do Josu: aquela mania de ser argumentativo, de entender o que pensei e não disse, de ler meus olhos falantes. Inevitável, e ainda foi aprender comigo. Passou a ser maninho com direito a intromissões das mais graves e tudo. Do tipo: uma hora e tanto de almoço ouvindo em detalhes minha dissertação de mestrado (tortura grave! mas ele perguntou!), ou pior: não vai para área meio (ao que ele podia responder: que tu tem a ver com isso, sua doida, tu nem trabalha mais junto comigo!?), ou ainda: me decepcionei contigo, achei que tu era um homem de outro tipo (ao que ele podia responder: tu é só minha colega de trabalho, pirou de vez!?). Minha sorte é que o Rafa tem dois irmãos mais novos e a minha mania de irmão mais velho, então ele entende o que eu digo e principalmente o que eu não digo.

Depois veio a Tinga e uma das experiências mais incríveis que tive (espero muito ainda ter outras semelhantes, embora saiba que igual não haverá), o Murilo foi minha tábua de salvação ao chegar num mundo que não era meu. Teve a paciência de ensinar a chefe para ser chutado para fora de lá por ela em poucos meses. Não pensem que ser meu irmão é coisa boa ou fácil. Eu sei que desrespeito as pessoas, faço caretas e as obrigo a fazer o que eu acho certo, mas quando vi o Murilo praticando muito de liderança mesmo que sem se dar conta e escondidinho lá num cantinho, tive de empurrá-lo para uns processos de seleção a fim que ele entendesse seu lugar naquilo tudo. Talvez eu nunca mais tenha oportunidade de trabalhar com uma pessoa tão meiga e que, talvez por ter um irmão mais velho muito próximo, tenha entendido tão bem meu atropelo.
Depois vieram a Mi e o Ezequiel, que passam dizendo: tu parece o mano e tu parece minha irmã, respectivamente. Os dois também vem de famílias de três irmãos e tem dois irmãos mais velhos a se intrometer em casa e mesmo assim tiveram a paciência de me aturar no trabalho, de rir das minhas caretas e de, como todos os meus irmãos, ouvir meus olhos dizendo: não é assim!, tinha de fazer isso!, vai dar errado! - sem nenhuma delicadeza e sem medir as palavras (mas, a final, olhos não usam palavras!).
Por fim, as super power-full girls: Bonni, Bruna e Júlia. A Bonni com aquela vitalidade incontida que contagia mesmo depois de cuidar do bebê doente e de atender sozinha cem pessoas em dia. Com uma larga experiência de vida que minha vida não me trouxe e ainda assim com humildade de me ouvir a me intrometer na sua vida pessoal: vai estudar, criatura! vai isso, vai aquilo. Com uma habilidade espantosa de fazer falar sem parar de toda vida. A Bruna com a minha loucura de querer saber saber de tudo, estudar tudo e arrastar o irmão ele queira o não, que nem eu faço com os meus. a Júlia com aquela inocência que em nada se confunde com ignorância, mas que dá um medo de que alguém não compreenda ali adiante.

Do que concluo que tenho de aprender a fazer amigos. E parar de adotar todos os irmãos que encontro e achar que todos eles vão aguentar meu jeito impositivo de lidar com a vida deles.

Talvez possa até fazer dos meus irmãos amigos.

Mania de irmã mais velha

Ontem, no casamento da minha irmã, me dei conta da minha grande mania de controle. Percebi que não estar no controle das situações me deixa constrangida e apavorada. Não lido bem com outras possibilidades. Não que isso seja bom, normalmente não acho que seja. Mas é que não tive outra escolha na vida.

Com treze anos, a vida me mostrou que não está no controle de ninguém, quando meu pai saiu de casa e não voltou mais sem que ninguém quisesse ou esperasse por isso deixando nosso mundinho cor rosa em ruínas, não tive escolha. Agarrei todas as outras coisas que podia controlar. E o que não podia também. Peguei minha mãe pela mão (talvez a metáfora mais adequada fosse que peguei-a pelo pescoço) e saí a arrastando vida a fora, e ela deixou eu achar que estava mesmo no controle, possivelmente por reconhecer a minha dificuldade em ficar sem ele. Sempre reconheci a inteligência, a força, a autonomia, a abnegação da mãe em em flexibilizar-se para nos poupar a contrariedade; mas ainda assim sempre "peguei para mim" a responsabilidade das coisas, mesmo que não fossem de minha responsabilidade.

Com a Rafa e o Jô foi ainda pior. Enquanto estive mais perto deles, mais do que orientei, muitas vezes os obriguei com todas as minhas forças a fazer o que achava certo. Coloquei a Rafa sentada por milhares de horas a fio na escrivaninha para estudar, mesmo que, na maior parte do tempo, ela ficasse lá sem estudar. O Jô acabou saindo mais parecido comigo nos hábitos e pensamentos, talvez para sofrer menos, afinal, a Rafa berrava e esperneava reclamando das minhas imposições, muitas vezes doidas, mas que faziam muito sentido quando eu tinha 14 ou 17 anos e estudava tudo o que conseguia para entrar na Universidade Federal que era imposição da família (já que todos estudaram lá), mas também a alternativa que me restara.

Talvez, ontem, eu tenha me dado conta que os dois cresceram, que eu acabei me afastando depois de dois anos fora de casa, que eles fazem as escolhas deles e, mesmo que eu aconselhe, eles fazem o que querem e eu não posso protegê-los dos resultados disso. Eu disse para Rafa não tentar se casar e se formar ao mesmo tempo (logo eu que estou sempre fazendo quinze coisas as mesmo tempo), porque não queria que ela sofresse isso. Mas também, e provavelmente isso tenha sido extremamente positivo para ela, eu não estava suficientemente próxima para obrigá-la a fazer o que eu queria, como fiz inúmeras outras vezes - como quando a obriguei a catar uma bolsa, mesmo que voluntária, no primeiro semestre da faculdade e quando a chutei para o intercâmbio; coisas que ela sempre aceitou por entender que eram boas, mas também por estar acostumada a querer cumprir minhas expectativas. E eu criei várias.

Durante esses meses que antecederam o casamento-conclusão de curso da Rafaela vi que nunca mais estarei tão próxima a ponto de protegê-los de tudo (menos de mim mesma). Todos os sustos da semana que pareciam anunciar que em breve tudo ia pelos ares, os telefonemas que só encontravam vozes chorosas foram criando mais ansiedade e tensão. Passei a semana reclamando das decisões da Rafa e tentando me convencer a não julgá-la, a tentar entender seus motivos e principalmente a tentar me convencer de que ela é adulta, vai continuar sendo minha maninha, mas não é mais o presentinho que ganhei de aniversário adiantado, minha versão de mim mesma aprimorada. A Rafa é dela mesma e eu tenho de me contentar em saber que eu ajudei-a a ser assim.

Ontem, quando pisei no salão, algumas coisas ainda não estavam resolvidas, eu me assustei. De repente, minutos antes da cerimônia iniciar, percebi que não sou capaz de impedir a Rafa de sofrer as consequência de suas escolhas e muito menos daquelas lembranças que a vida insiste em nos dar de que não estamos no controle. Notei que não podemos preencher os espaços que ela vai nos deixando, por mais que nos esforcemos para isso. Por isso chorei, pois via que nem tudo estava como eu gostaria, para minha ansiedade (pois eu queria estar mais perto) e para sorte da Rafa (que pode fazer as coisas do seu jeito e tudo dar certo e ficar maravilhoso como de fato foi). Depois de verificar que tudo se resolveu, eu ainda queria dar uma chineladas na Rafa por nos fazer ficar mais tensos do que o inevitável.
Por fim, quando tudo virou festa, vi que era só a festa da Rafa do jeito dela e tudo ia dar certo. Sempre soube que a Rafa é muito diferente de mim, mas entendi que vai dar certo, do jeito da Rafa, e fiquei feliz e orgulhosa de ter ajudado ela a ser quem é.

É bem possível que eu ainda passe o resto da vida me achando menos perto "das crianças"- como sempre chamei meus dois irmãos mais novos, mesmo muito depois deles deixarem de sê-lo - do que eu gostaria. Mais provável ainda que eu continue querendo controlar suas vidas para que façam tudo certo e não sofram nem mesmo o pouco que eu sofri. Mas acho que agora vou entendê-los quando me contrariarem e talvez nem queira dar umas boas chineladas, porque eles estão bem preparados para decidir e enfrentar "a dor e a delícia de ser o que são."

domingo, 8 de julho de 2012

Amigos e irmãos

Lendo essas frases inúteis de Facebook me deparei com uma mentira absurda: Existem amigos que são como irmãos.

Não. Não existem.

Eu não estou engada. Tenho amigos que são preciosos, mas irmandade é outra coisa.

Existem, isso sim, amigos que são tão bons quanto irmãos.

Mas irmão, é só irmão mesmo.

Irmandade é fatalidade, é destino.

Amizade é afinidade, é caminho.

Irmão, por princípio, não se gosta muito, é aquele cara com quem tens de dividir o pai, a mãe e a casa. E pior: às vezes, o quarto, o computador, o rádio, a tv, o espaço e o tempo e o vó e vó e os livros e a escola, alguns amigos, o doce que mãe fez, o dinheiro que a vó deu e etc (nesse caso, etc é etc mesmo, não é por que não há mais o que dizer, é por que não há espaço e tempo para dizê-lo).

Irmão é competição. É do irmão que se aprende a ganhar e também com quem se aprende a repartir.

Irmão não é afinidade. Os irmãos não deixam de ser irmãos se ouvirem funk ou sertanejo universitário. Se fizerem economia ou ciências sociais. Se ficarem ricos ou virarem hippies. Irmão não se separam.

Irmãos são.

Nada abala o que é.

Podem ficar de mal, sem falar, mas continuam sendo.

O tempo vai burilar a relação. O chato ali descrito vai passar contigo pelo melhores e piores momentos da tua vida, só ele vai lembrar daquela banheira que tinha lá em casa e da torta de bolacha que a mãe fazia, só ele vai lembrar como era bom lá na praia quando as pranchas eram de isopor e só ele vai saber como e por que essa e aquela dor doem.

Muitos amigos vão saber de algumas dessas coisas. Mas só o irmão vai saber de tudo isso junto. Por isso existem amigos que são quase irmãos, são bons como eles, mas nada é como um irmão.

Que me perdoem os filhos únicos, que acham que têm muitos irmãos, mas irmão é só irmão MESMO.

domingo, 1 de julho de 2012

A propósito do amor

Frequentemente acordo apaixonada.

Milhares de especialistas escrevem sobre o amor e o casamento. Dessas teorizações saem uma dúzia de conselhos para acertar o parceiro ideal.

Eu acho isso de uma inutilidade total. Nada disso funciona sem amor.

Tenho mania de ler. Leio tudo que passa na minha frente e, certas vezes, alguns livros e revistas sobre relacionamento cairam em minhas mãos. Quando vi aquela prescrição: os opostos se atraem, mas só os iguais vivem juntos por toda vida, pensei: tô frita.

Meu marido é muito diferente de mim, isso é tão patente que desde que pusemos os olhos um no outro, sem ao menos proferir uma palavra, vimos que éramos incompatíveis segundo todos os manuais. Mas também, desse primeiro olhar de identificação, nasceu o amor.

É só isso que sustenta o nosso relacionamento: muito amor. Falamos línguas diferentes, sempre que tentamos "teorizar" sobre a relação só surge confusão, mas basta olhar nos olhos e a nuvem de dúvidas se desfaz. Não sei o que é, mas é tão concreto que chega a ser palpável, parece que temos uma ponte.

Ele gosta do isolamento, do ruído do rádio e da tv, de música barulhenta, de beber cerveja e jogar quieto. Eu gosto do silêncio depois de um dia de trabalho, de um livro para ler num canto, de um filme para ver junto. Somos opostos, mas de tal forma atraídos que não nos separamos. Estamos juntos há 14 anos e brigamos muito (afinal não nos entendemos), mas não nos distanciamos por um dia sequer e cada vez nos amamos mais e com o tempo a tolerância cresceu e fazemos muitas coisas por amor ao outro e até aprendemos a gostar de algumas coisas do outro. Só o amor gera compreensão.

Do que concluo que os manuais só podem estar redondamente equivocados. Ou, talvez, eles sejam escritos para um mundo onde o amor não existe, onde só podemos conviver com os iguais. Um mundo dominado pela intolerância.

Então quero fugir dos manuais e viver meu amor complicado, difícil e tolerante. Quero aprender outra língua, outra cultura, outra religião sem deixar as minhas. Quero ser casal sem deixar de ser eu mesma - coisa que parece de outro mundo, mas que eu gostaria que fosse só o "normal".

sábado, 23 de junho de 2012

A propósito de professores



Não é por que sou professora (até por que sou professora só de meio turno), mas não existe nenhuma outra profissão que exija tanto esforço. O nosso trabalho está sempre conosco: tudo que lemos, vimos e ouvimos é filtrado para sala de aula. Passamos a vida a preparar, ministrar e corrigir e ministrar novamente até que se compreenda. Mas não é só esse nosso desafio.

O professores enfrentam salários miseráveis, péssimas condições de trabalho e alunos cada vez mais arrogantes (e, por isso, com mais dificuldade de aprender) que tratam professores como se fossem clientes e não alunos. A propósito, talvez devêssemos voltar a chamar a relação de aluno/professor de relação discípulo/mestre para voltarmos a saber qual é fluxo do conhecimento. Sim, sou meio direitista nesse aspecto - acho que professores aprendem muito com seus alunos, mas ainda acho que eles tenham de ter mais o que ensinar.

Os professores também enfrentam uma profissão não regulamentada na qual ocorrem n invasões de mercado de trabalho, precisam lidar com a ilegalidade de seus governantes que não pagam o que justiça manda e ainda são atacados pela polícia se tentam reivindicar seus direitos. Além de tudo isso, acabam por se prejudicar, pois sempre se solidarizam com seus alunos de tal forma que tiram de si para doar.

Hoje fui a Canoas como minha irmã ver seu vestido de noiva e, na volta, me deparei com uma imagem peculiar: dois jovens vestindo kimonos com caixinhas pedindo dinheiro para irem a uma competição. Enquanto os jovens pediam, o professor passavam entre os carros tentando explicar a situação da seguinte forma: procurem na internet, em agosto, vamos ao campeonato e não ganhamos nenhuma ajuda governamental.

A falta de apoio ao esporte é outro tema relevante, mas não foi isso que me tocou.

O que me maravilhou foi ver aquele professor que deixou de estar com sua família, ou de descansar da semana cheia de trabalho para estar ali, em pleno sábado de sol: na sinaleira, pedindo doações e incentivando seus alunos a sonhar.

Sim, isso é o mais importante.

Ele está ensinando, através do seu exemplo, a dedicação, ele está incentivando o esporte, ele está prestando um serviço imenso à sociedade; mas principalmente ele está ensinando esses jovens a sonhar, a tentar, a se esforçar para conseguir até a última opção. E, mesmo que eles não consigam, isso ficará nas suas memórias para sempre: o empenho na tentativa e a dedicação daquele professor.

P.S.: Segui a instrução do professor e procurei na internet mais sobre o projeto:

http://canoasriobrancojudo.blogspot.com.br/2012/04/judocas-do-rs-vao-as-ruas-pedir.html

domingo, 10 de junho de 2012

A propósito de uma perda

Bom, sexta fui às pressas para Cachoeira. Na quinta à noite me avisaram que a Dinha tinha morrido. Chorei muito, arrumei as malas e fui.

No velório, tinha um ódio imenso de cada um que chegava com um consolo esfarrapado: ela descansou (quem deve estar cansado é tu, cara de pau, ela estava cheia de planos, queria fazer uma plástica na barriga, tinha um vestido novo para o casamento da Rafa e tinha prometido que me veria defender minha Tese), foi melhor assim (esses eu juro que queria arrancar os olhos! Melhor para quem??) ou ela foi para uma lugar melhor (alguém perguntou a ela?).

Não sei se felizmente ou infelizmente não foi só de ódio minha sexta-feira. Quando os amigos próximos chegaram e, com um sentimento sincero, nos abraçaram, a tristeza foi grande. Um momento em especial foi terrível: a Lucinha, muito amiga da Dinha, com quem convivíamos todo verão (pois ela ia para casa da Dinha, na praia, que é junto a casa da vó, onde veraneávamos), saiu da capela aos prantos, trêmula, muito nervosa, muito delicada (como sempre) e incrivelmente sincera disse o que todos queríamos dizer: não acredito, não consigo exprimir minha tristeza, não entendo. Nesse momento, ninguém resistiu ao pranto, a cena era demasiadamente tocante.

Tenho tentado não chorar, mas é difícil. Ontem fui a casa dela buscar umas coisas que o vô tinha esquecido. Foi horrível ver a casa dela e saber que ela não voltaria. Achei que voltando para casa talvez ficasse mais fácil, afinal ela esteve aqui só uma ou duas vezes (moro aqui a pouco mais de um ano); mas não ficou.

Vou pegar uns livros e eles estão na cristaleira que ela deu. Venho para o computador e pego o cobertor que ela também deu, olho para mesa e lá está a toalha de mesa que vi na cerca da casa dela e disse: serve direitinho na minha mesa! e ela tirou da cerca na mesma hora, colocou numa sacola e mandou que levasse. Abro o armário e lá estão as panelas que ela ganhou do marido e nunca usou, deu-as quando vim para esse apartamento e não tinha nenhuma panela. Quem lê isso acha que ela me deu demais. É verdade. E se eu escondesse todas essas coisas ainda restaria muito - tudo aquilo que não será gasto pelo tempo: o curso de inglês para entrar no doutorado como ela queria, a especialização para eu não parar de estudar quando me formei, as inscrições para o mestrado, doutorado e inúmeros concursos, até os que passei.

Em suma, não há como escondê-la de mim e ela vai ficar doendo aqui por muito tempo. Provavelmente para sempre.

sábado, 19 de maio de 2012

Perdas e Danos

Não sou muito boa em perder, em não ter, não poder... Tudo é culpa dela, afinal, ela sempre dizia: Não fica com vontade, pede para a Dinha que ela dá um jeito. Assim, na terceira pessoa mesmo. Ela é engraçada com umas coisas... Amanhã, vou pedir para ela ficar, é isso que eu tenho vontade agora, ela que dê um jeito! Ainda não consegui encontrá-la consciente. Hoje, quando cheguei, ela ainda não tinha acordado, só acordou a tarde. Amanhã quero vê-la e pedir para ela ficar - ainda não está na hora. As pessoas dizem que ela já está velha demais, com 80 anos e todos esses problemas, ninguém mais acredita na recuperação. Eu não sei se quero acreditar. Tenho medo de acreditar e sofrer mais, mas, no fundo, sei que não tem jeito, vamos sofrer demais. Uma mulher exemplar - cheia de erros e injustiças, mas perfeita em sua humanidade - briga, enlouquece, grita, fala barbaridade; mas sabe perdoar, se arrepender e voltar atrás - é o que vale. Cheia de amor, carinhosa, risonha e alegre. Preguiçosa também: vai lá buscar um copo de Coca para Dinha, mas cheio não - só a metade. Ela cuida de todo mundo, muita gente ainda depende dela. Ela está cheia de planos: o casamento da Rafa, a minha defesa, a formatura da Rafa e do Jô - ela precisa de força. A única justiça possível é que ela se recupere completamente e viva mais uns dez anos. Vou pedir - ela tem que atender, como sempre.

domingo, 6 de maio de 2012

Meus velhinhos

Sei que me torno repetitiva - já reclamei n vezes do medo que o tempo dos meus velhinhos acabe. Sei que ele se torna cada vez mais curto, mas me embrulha o estômago pensar que ele vai acabar. Dessa vez foi a Dinha a responsável pelo susto. E digo responsável em todos os aspectos, pois ela está muito doente por culpa de sua teimosia. Espero que a mesma teimosia a salve. Primeiro ela decidiu lavar o quarto. Por que cargas uma senhora de quase oitenta anos que paga a terceiros para que façam seu trabalho doméstico decide lavar a porcaria do chão!? Deixa o chão! Nada, ela quer o piso brilhando, escorregou, quebrou três costelas, foi para o hospital e deram um remédio errado para ela, apesar disso, ela se recuperou e voltou para casa. Antes disso, teve uma infecção urinária, daquelas comuns, o médico a mandou tomar antibióticos por 3 meses, ela tomou 1 e decidiu que estava boa e gastava demais com aqueles remédios!!! Também parou com o remédio para o coração - sei lá por quê; afinal ela não está podendo falar. De uma hora para outra essa bomba ia explodir. E quase a levou. Na quinta à noite, o vô e a vó ligaram para dizer que a tinham levado para o hospital muito mal. A mãe quase teve uma coisa e me ligou chorando tanto que não entendi nada, mas fiquei desesperada, ela falava em infarto e eu achei que estivessem operando o coração dela naquela noite. Não dormi. Sexta foi uma angústia só. Cada vez que o telefone tocava, meu coração parava. Estava esperando o pior. Por um momento achei que tivessem escondendo algo de mais grave, contava cada segundo, só queria ir para Cachoeira vê-la, saber se estava viva. Chegamos lá tarde, umas 11 horas e a cara do vô e da vó assustaram um pouco, eles disseram que o médico não dava esperanças. Sempre mantive a esperança, apesar do desespero. No outro dia, eu, a Rafa e o Jô corremos para pegar as únicas três senhas para visita da manhã. O Jô entrou primeiro, saiu rápido e lívido. Depois eu fui. Peguei a mão dela e disse que era eu, que ela tinha prometido ir na defesa do meu doutorado, que tinha prometido cuidar do meu bebê e tinha prometido viver até os noventa, no mínimo, logo ainda faltavam 10 anos, ela que tratasse de melhorar. Pelos bipes no monitor vi que ela me ouvia e pedi a sério que ela ficasse, que ainda precisávamos muito dela - me esforcei muito para não chorar - estava com ela e precisava passar força, mas foi difícil. Saí logo também. O médico veio falar conosco. Disse que ela melhorara um pouquinho, ainda não era hora de comemorar, ainda não sabiam onde era a infecção e os rins dela haviam parado. À tarde fariam diálise. Minha esperança cresceu um pouquinho. No final da tarde, fomos de novo vê-la; mas a disputa por uma senha ainda estava muito acirrada. Todos querem uma. Ela é uma pessoa extremamente querida por todos os sobrinhos e sobrinhos-netos. Não há um de nós que não deva uma grande conquista a ela - eu devo quase todas. Fiquei triste por não encontrar alguns primos lá. Não sei como as pessoas podem ser tão ingratas e egoístas. Fiquei alguns minutos com ela outra vez. Disse de novo que precisávamos dela e pedi a Deus que não a levasse. Com tanta gente inútil no mundo, que escolhesse outro, eu mesma podia fazer uma lista com 10 nomes que não fariam falta a ninguém. Depois achei que estava enlouquecendo e saí da UTI. Ela já desinchara bastante. O médico falou conosco novamente. Disse que ela respondeu bem a diálise, mas o quadro ainda era muito grave. Mais uma noite de ansiedade e maus pensamentos... Hoje de manhã, mesmo sabendo que nenhuma ficha sobraria para mim, fui lá. O médico nos procurou e disse que agora ela estava reagindo bem, o rins voltaram a funcionar e aparentemente a infecção começou a regredir. Graças a Deus! Que alívio. Essa será uma noite cheia de esperança e só com um pouquinho de angústia. Espero ter a oportunidade de brigar com ela por toda essa teimosia e vê-la rindo aquela risada inteira que só ela sabe.

sábado, 24 de março de 2012

Deus, por favor transforme esses ratos em homens

Tenho estado muito perplexa. Não encontro mais homens como os que meu avô me ensinou que fossem. Meu avô é um homem muito sábio, por isso ele escolheu viver a vida ao lado de uma mulher muito inteligente.

Bem, mas voltando a minha vida, quando vejo-os de longe, todos todos de seus cargos e suas gravatas, eles pareçam um pouco daquilo que acredito que sejam; mas, bem de perto, em uma situação improvável, é impossível reconhecê-los.

É provável que seja só por esse motivo que as mulheres tomaram conta do mundo.

Enquanto os homens pensam sobre como devem agir somente quando as situações se definem diante deles, as mulheres agem, pois já decidiram meticulosamente como agir se isso acontecesse, enquanto lavavam a louça (e isso não é nenhum tipo de machismo, as mulheres continuam trabalhando em casa e os homens, enquanto lavam a louça, não fazem nada, só lavam a louça).

De repente, homens e mulheres são interrompidos em seus afazeres diários e se deparam com uma situação inusitada.

Inusitada para quem não está "lendo o cenário" e explorando as possibilidades - as mulheres estão. Elas vêem o jornal enquanto correm na esteira. Sabem as posições dos outros setores enquanto conversam com a mulher ao lado no vestiário ou no banheiro. Elas já exploraram as outras possibilidades enquanto dirigem para o trabalho.

E agora o que faremos? Dizem os homens.

Tal coisa, respondem as mulheres. Mas e se...? Respondem os homens tolos.

Os homens sábios seguem as mulheres enquanto ainda há tempo. Sabem que elas já pensaram no "e se?".

Homens tolos pensam, retardam as ações, perdem o timing. Parecem medrosos, confusos e frágeis, de tão perplexos, ficam paralisados.

Vendo esses homens agirem, penso: Deus, por favor transforme esses ratos em homens!!

Acho que vou empreender: vou contratar me avô e empresariá-lo em palestras e consultorias: Como ser Homem no século XXI. A necessidade é patente, resta saber se eles já foram informados - disso dependerá nosso sucesso.